sexta-feira, 5 de março de 2010





O caso do italiano que quase virou pizza!



Vocês se lembram do caso Cesare Battisti? Já esqueceram? Eita povo de memória curta! Deixem-me lembrar-lhes:Cesare Battisti é um ex-ativista político que, segundo o governo italiano, assassinou quatro pessoas entre 1978 e 1979 e deixou o filho de uma das vítimas paraplégico. Fugiu para a França e, depois, acabou se enfiando por aqui. Foi descoberto e se acha preso no Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília, desde março/2007. Battisti sempre negou a autoria dos delitos,mas, por esses crimes, foi condenado à prisão perpétua na Itália. O Ministro da Justiça Tarso Genro concedeu refúgio político ao italiano.O Governo da Itália pediu a extradição de Battisti para que lá cumprisse pena porque, segundo alega, os quatro assassinatos não tinham cunho político, pois a Itália vivia no momento dos crimes de Battisti clima de absoluta estabilidade política e democrática.
O caso foi parar no Supremo. No julgamento, prevaleceu o entendimento do relator Ministro Cezar Peluso. Ficaram vencidos os ministros Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Eros Grau e Marco Aurélio, que indeferiam o pedido de extradição.
O ministro Cezar Peluso:

(1º) reconheceu a ilegalidade do ato de concessão de refúgio do ministro Tarso Genro;
(2º)deixou claro que os crimes atribuídos a Battisti eram comuns, e não políticos; e
(3º)não estavam prescritos. Battisti podia, portanto;
(4º)ser extraditado, nos termos da L.nº 6.815/80 e do tratado de extradição firmado entre o Brasil e a Itália.

Por um desses balaios-de-gato que só acontecem por aqui, o acórdão saiu truncado e noticiaram que, a despeito da decisão do Supremo, prevalecia a legalidade da concessão do refúgio e que cabia ao Presidente da República decidir, discricionariamente, se extraditava o italiano e cumpria a decisão do STF ou deixava o italiano na dolce vita por aqui, prestigiava o seu ministro da justiça, contrariava o STF, ignorava os compromissos internacionais assinados pela sua diplomacia e dizia aos italianos que nós não estamos nem aí para as leis do seu país.
Nessa questão da “discricionariedade” do Presidente da República, ficaram vencidos os Ministros Cezar Peluso, relator, Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e Gilmar Mendes. O relator Cezar Peluso quase foi à loucura com a maneira canhestra dos votos, a ponto de reclamar que seria quase impossível redigir um acórdão com tantos pontos conflituosos. Agora vem a notícia de que o STF decidiu, por maioria, depois de o ministro Eros Grau explicar os fundamentos do seu voto, acolher questão de ordem levantada nos autos do pedido de extradição para que fique constando da Ata de Julgamento, e portanto do acórdão, que o STF, por maioria, naquela sessão de novembro de 2009, (1º) reconheceu que a decisão de deferimento da extradição não vincula o Presidente da República, nos termos dos votos proferidos pelos Ministros Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa, Carlos Britto, Marco Aurélio e Eros Grau, (2º) mas o presidente não pode agir discricionariamente e (3º) tem de observar os termos do tratado internacional de extradição que o Brasil firmou com a Itália.Bem. Vamos botar os bois na frente do carro. Meus conhecimentos de Direito Internacional são poucos, e meu raciocínio jurídico é pouco mais que zero. Se bem entendi, o que o STF decidiu pelo voto do ministro Cezar Peluso, depois dessa "questão de ordem", foi o seguinte:

  • os crimes de Battisti são comuns;

  • sendo crimes comuns, não estão prescritos;

  • se não estão prescritos, Battisti está obrigado ao cumprimento da pena na Itália, que, no caso, é de prisão perpétua;

  • se não são crimes políticos, a concessão de “refúgio” é irregular e escapa à competência do ministro da justiça;

  • se a concessão de refúgio é irregular, prevalece o pedido de extradição;

  • se o acórdão do STF, que decidiu pela extradição de Cesare Battisti, não vincula o Presidente da República, o STF pode ser dissolvido de imediato porque estamos vivendo numa ditadura, e não num estado de direito;

  • a decisão do STF não vincula o Presidente Lula, mas Lula não pode agir discricionariamente e tem de respeitar o tratado bilateral de extradição firmado com a Itália;

  • se a decisão do STF não vincula Lula, mas Lula não pode agir discricionariamente e tem de respeitar os tratados, então a decisão vincula, já que, segundo Aristóteles, uma coisa não pode ser e não ser ao mesmo tempo;

  • se a questão de ordem agora suscitada retifica a Ata de julgamento de 18/11/2009 para constar que, embora a decisão do STF não vincule o Presidente da República, ele, o Presidente, não pode agir discricionariamente, e deve observar o tratado bilateral de extradição assinado pelos Governos do Brasil e da Itália, significa que Lula só tem uma saída: cumprir a decisão do STF, que é a de extraditar Cesare Battisti, porque há um tratado bilateral que o Brasil assinou com a Itália e Lula não pode, como mandatário, desrespeitar, sob pena de criar um incidente internacional.


  • O Presidente da República tem de agir como Presidente da República, e não como o Presidente de Honra do PT.
Enfim:
Arrivederci, Battisti! Ci vediamo!
(Adeus, Battisti! A gente se vê por aí!)
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1.O autor(foto by Rafa) é Juiz do Trabalho no Rio de Janeiro(7ª Turma). Ama a Itália e os italianos, mas, sobretudo, ama a lei, a ordem democrática e a Instituição a que pertence.
2.A ilustração do texto está em  http://myllavieira.zip.net/images/Pizzaiolo.jpg



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