quarta-feira, 7 de abril de 2010





Incompetência, Intolerância, Ignorância.
zé.


Por decisão da 1ª Câmara Civil do TJ do Rio de Janeiro, a sociedade empresária Barcas S.A., que tem o monopólio do transporte público de passageiros entre Niterói e Rio de Janeiro, foi condenada a pagar R$15.000,00 por danos morais a um passageiro agredido pelos “excelentes empregados” dos que se julgam donos desse pedaço de mar. A vítima, W.F., é portadora de necessidades especiais(deficiência mental) e possui passe livre intermunicipal, com direito a acompanhante, mas foi impedida de embarcar juntamente com a mãe sob alegação de que o cartão estava vencido. Depois de muita explicação e má vontade do pessoal das barcas, apenas o garoto pode embarcar. A mãe ficou na plataforma. O rapaz entrou em crise e os “preparadíssimos” empregados das Barcas, na tentativa de acalmá-lo, usaram de violência e, por fim, o expulsaram da estação. Para a relatora, desembargadora Maria Augusta Vaz, houve constrangimento e agressão, o que teria gerado na vítima angústia, dor, sofrimento, sendo justa a condenação da sociedade empresária, por ato de seus prepostos. Digo o que ela disse: “Ora, é evidente que o tratamento truculento e grosseiro dispensado ao autor pelos prepostos da concessionária-ré pode ser definido como defeito na prestação dos serviços, estando, pois, apto a legitimar a obrigação de indenizar, pois a sociedade-ré tem o dever de manter pessoal adequadamente preparado para lidar com o enorme número de pessoas que diariamente utilizam seus serviços, impedindo, assim, que problemas como este venham a ocorrer”. A magistrada está certíssima. O problema, Excelência, não é nem de educação ou de preparo interno de pessoal. O caso é mesmo de polícia, de investigação pelo Ministério Público, de intervenção do Poder Público. Há um monopólio arranjado sabe Deus a que preço, e fruto de um espúrio favoritismo político. A Barcas S/A, onde a maioria do capital social pertence aos donos de empresas de ônibus de Niterói, faz o que quer com a população do lado de cá da baía. Conto um caso que aconteceu comigo. Ninguém me contou. Eu vivi a situação. Por volta de seis da tarde, uma quarta-feira, eu retornava de minha sessão na 7ª Turma, exausto. O barco começou a adernar à direita, foi perdendo velocidade e embicando para os lados da cabeça da pista do Aeroporto Santos Dumont, ali onde ficam os tanques de querosene da Petrobrás, até que, sem hélice e sem governo, bateu e ficou encravado nas pedras semi-submersas que dão sustentação à cabeça da pista de pouso dos aviões. Ficou torto de um lado e as pessoas do lado mais próximo à água começaram a se inquietar e a tentar mudar de lugar para o lado mais alto do barco. A expressão de medo no rosto da tripulação era visível. O corre-corre desnecessário dos tripulantes, os encontrões, a ordens tensas e desconexas dadas pelo sistema de som davam ao ambiente um clima de Titanic batendo num iceberg. O barco estava relativamente seguro, não havia por que tanta balbúrdia. De repente, aos berros, um desses membros da tripulação pediu silêncio e disse aos passageiros: ”Gente! Gente! Fiquem em seus lugares. O socorro vai chegar logo. Não mudem para o lado de lá. Não estão vendo que o barco está afundando?”. Nessa hora, Excelência, teve gente desmaiando, gritos, histeria, gente que pulava sobre a cabeça dos outros. Uma senhora ficou gélida, petrificada, tremia tanto que somente sairia dali se arrancada com cadeira e tudo. Agarrou-se ao meu braço com tanta força que mesmo muito tempo depois as marcas das unhas ainda se viam cravadas em meu braço. Horas depois, um outro catamarã encostou-se à lateral do barco avariado e as pessoas foram sendo comboiadas por um passadiço improvisado com tábuas. Mandei e-mail à direção das Barcas relatando o ocorrido e pedindo providências. Faz mais de dois anos isso. Até hoje estou esperando uma resposta e as providências. Se este Estado de São Sebastião do Rio de Janeiro não fosse o que sempre foi desde 1808, Excelência, um feudo mal administrado, capacho do Rei, talvez as coisas mudassem. Mas tigre acostumado a comer na mão do tratador vira cãozinho de madame...
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1.O autor é Juiz do Trabalho no Rio de Janeiro(7ª Turma) e toma as barcas para o trabalho, todos os santos dias. Isso, que está retratado no julgamento, é café pequeno perto do que já presenciou ali.
2.Fonte: site do TR do Rio de Janeiro(Processo nº 0148281-80.2006.8.19.0001), disponível em 5/4/2010.
3.Ilustração:http://www.jtm.com.mo/NEWS/20060620/news_images/20-01-2.jpg

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