domingo, 7 de março de 2010



Dano Estético.
zé geraldo


A Quarta Turma do STJ condenou uma empresa a pagar à vítima de atropelamento em acidente ferroviário indenização por dano estético de R$30 mil e meio salário mínimo a título de pensionamento mensal vitalício. A vítima teve parte da perna amputada em razão do acidente. O Tribunal de Alçada Civil de São Paulo negou provimento ao apelo da vítima afirmando não ter havido prova de que exercesse atividade remunerada à época do acidente e que danos morais e danos estéticos não podem ser cumulativos. A vítima apelou ao STJ sustentando o oposto: dano estético e dano moral podem cumular-se se provenientes de um mesmo fato e o fato de não haver prova do exercício de atividade remunerada no dia do acidente não impede a procedência do pedido de pensionamento. O ministro Aldir Passarinho Junior concordou com ambos os argumentos. Disse que a Corte tem entendimento firmado no sentido de que o pensionamento mensal é devido ainda quando falte prova do exercício de atividade remunerada à época do acidente porque a regra é a de que a pessoa venha a exercer a atividade remunerada, e não a de que a exerça, efetivamente. Para o relator, o que conta para a procedência do pedido é que a vítima tenha tido a possibilidade de obter emprego ceifada ou diminuída em razão do acidente.Quanto aos danos estéticos e morais, o ministro foi ainda mais professoral: o dano estético é autônomo em relação ao dano moral. A fixação do valor a ser pago pelos danos morais e pelos danos estéticos pode ser única, mas deve levar em consideração os dois tipos de dano. Segundo disse, o que importa “é que, de uma ou outra forma, seja valorada a lesão estética, quando ela ocorra, como forma compensatória à repercussão que o aleijão causará na autoestima da vítima e na sua aceitação perante a sociedade”. Mais não disse nem era necessário...

Doutrina



Dano estético é todo ato ilícito que modifique para pior a arquitetura das formas externas da pessoa, e que, de modo permanente, provoque a diminuição do belo ou da harmonia das formas externas do trabalhador, a ponto de desgostá-lo ou afeá-lo em seu bem-estar estético, físico ou psíquico, com ou sem redução da capacidade laborativa. O dano à integridade estética é autônomo e pode ser cumulado com o dano moral. Dano estético é sequela física de um ato ilícito invasivo da saúde do indivíduo, entendido o termo saúde não apenas como bem-estar físico, mas também psíquico e estético, já que enfermidade “não é apenas o processo de patológico de degeneração orgânica ou física. Existe uma variada gama de moléstias mentais e de perturbações psíquicas”. Em regra, a dor moral nasce concomitantemente com o dano estético, mas são coisas autônomas ab ovo, isto é, desde a origem. Tanto quanto os outros, o dano estético é o prejuízo, o aniquilamento ou a alteração de uma condição favorável, por ação natural ou pela mão do homem. Não há consenso na doutrina sobre se o dano estético é autônomo em relação ao moral, ou mero desdobramento dele. Noutras palavras, discute-se se existe um dano moral autônomo em relação ao estético ou se o afeamento da pessoa — dano estético — constitui em si mesmo o próprio sofrimento moral. Dano estético é a lesão à beleza física, à harmonia das formas externas de alguém. Não é somente o aleijão, mas todas as deformações e marcas que, mesmo mínimas, afeiam a vítima ou a desgostam por gerarem “permanente motivo de exposição ao ridículo ou de inferiorizantes complexos”. Como invasão ilícita da integridade estética, o dano estético é uma ofensa a um direito da personalidade e, como tal, gera reparação moral. Dano estético é, numa palavra, a diminuição do belo. Como o conceito de belo é relativo, examina-se o dano estético pelo cotejo entre o que a pessoa é e como era antes. Para que o dano estético se configure é necessário que, em primeiro, a lesão efetivamente enfeie e, em segundo, que seja permanente. Lesões superficiais e ocasionais não o tipificam porque o tempo tem o dom balsâmico de apagar ou arrefecer todas as dores, inclusive as morais, e de apagar as cicatrizes físicas. Aos poucos as lides trabalhistas vão incluindo pedidos de reparação moral por uso indevido de imagem do empregado e por danos estéticos como consequência das lesões físicas sofridas no ambiente de trabalho. Propõe-se um conceito jurídico de dano estético como sendo toda sequela física de caráter permanente resultante de um ato ilícito invasivo e que diminui o belo e a harmonia das formas externas do trabalhador. Com isso, circunscreve-se a lesão estética ao ato ilícito, que não demanda prova, ou, se demandar, se impõe ao agressor, e não à vítima. O conceito de belo é relativo, mas o de harmonia das formas externas é facilmente aferível em qualquer pessoa. Firma-se, também, o conceito de “lesão de caráter permanente”, para remarcar que lesões fugazes não constituem dano estético porque podem ser apagadas pelo tempo, dependendo da constituição de cada corpo. Alude-se, ainda, à desimportância de ter ou não havido redução da capacidade laborativa porque pode ocorrer que a lesão estética não diminua a capacidade produzir trabalho, mas de obtê-lo ou de se conservar nele, como é o caso de modelos fotográficos ou de profissionais que se ocupam de atendimento ao público. De último, conceitua-se dano estético como um direito autônomo, perfeitamente cumulável com a reparação por dano moral. Assim o faz porque as suas raízes são distintas: o dano estético tipifica-se na lesão, no aleijão, na deformação perene que afeia e constrange. O dano moral que dele decorre é o sofrimento subjetivo provocado pelo ato ilícito, o saber-se feio, o imaginar-se alvo dos olhares desdenhosos ou repulsivos, a diminuição do formato estético perante si mesmo. Tanto é possível haver dano estético sem prejuízo moral quanto dano moral sem prejuízo estético.
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1.O autor é Juiz do Trabalho no Rio de Janeiro(7ª Turma), Membro da Comissão de Jurisprudência, de bancas de concurso de ingresso na Magistratura do Trabalho, Presidente do Conselho Consultivo da Esacs, professor universitário, autor de livros jurídicos e de artigos jurídicos publicados no Brasil e na Itália (www.diritto.it). 
2.Fonte: Boletim Informativo de 14/12/2009).

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