domingo, 7 de março de 2010




Perigo não manda aviso!
zé geraldo.


O dramaturgo Nelson Rodrigues dizia que "o óbvio é difícil de enxergar". Nada mais exato! Existem, aos milhões, sentenças e acórdãos de tribunais do trabalho dizendo, com riqueza de argumentos, que o trabalhador que entra, ocasionalmente, em área de risco, não faz jus ao adicional de periculosidade. Os que sustentam essa tese partem de uma falsa premissa: não se pode pagar o adicional “cheio” (30% sobre o salário do trabalhador) se ele apenas episodicamente se expõe ao perigo. A tese é tão absurda que nem valeria a pena derramar sobre ela tanta tinta, mas o faço porque o ministro Aloysio Corrêa da Veiga, com a lucidez de sempre, disse que tanto faz se o trabalhador entra na zona de perigo por cinco minutos ou uma hora. O risco é o mesmo, e o adicional deve ser pago por inteiro. O ministro está certíssimo. O que os juízes que não pensam como o ministro não se dão conta, é que a lógica jurídica do pagamento do adicional de periculosidade é inteiramente distinta da do adicional de insalubridade. O adicional de insalubridade é escalonado em 10%, 20% e 40% do salário mínimo porque o agente insalutífero vai minando a saúde do trabalhador aos poucos. Em certos casos, leva anos até a saúde do empregado dar sinais de que foi atingida pelo agente insalubre. Com o perigo, não! Pode ser que nada aconteça durante o dia, mas, por infelicidade, o perigo decida mostrar as suas garras justamente naqueles fatídicos cinco minutos que o empregado a ele se expôs. Por isso, tanto faz se o trabalhador entrou na área de risco por um minuto ou uma hora, por uma hora ou pelo dia inteiro. O perigo não dá aviso prévio!
O adicional, qualquer que seja o tempo de exposição do empregado ao agente perigoso, é devido sempre por inteiro. Foi isso, com outras palavras, o que o ministro Corrêa da Veiga(foto ao lado) disse no RR-145-2007-051-18-00.0, em que condenou a Companhia de Bebidas das Américas —AmBev — e a J.M Empreendimentos Transporte e Serviços a pagarem adicional de periculosidade a um empregado que trocava cilindros de gás, duas vezes ao dia, ainda que gastasse em cada operação não mais que dois minutos e meio. O que entristece não é saber que muitos juízes pensam como a sociedade empresária. O que se lamenta, mesmo, é que o próprio TST, desde 20/4/2005, quando aprovou a Súmula nº 364 de sua jurisprudência uniforme, vem dizendo isso dia após dia, e os processos continuam chegando lá com as mesmas surradas teses. O que os recorrentes querem com isso, além de afrontar diretamente o princípio constitucional de razoável duração do processo, é dizer o seguinte aos ministros: "nós não estamos nem aí para o que vocês dizem ou sumulam; nós temos dinheiro e faremos o que nos der na telha!". Para o voto ficar completo, só faltou mesmo o ministro lascar uma multa monstruosa por recurso protelatório. Aposto como da próxima vez iriam pensar duas vezes. Porque o bolso, como o disse Agostinho Alvim, é o órgão mais sensível do corpo humano. Mexe no bolso pra você ver como dói!

Doutrina

Atividades insalubres são todas as que, por sua natureza, condições ou métodos de trabalho, exponham os trabalhadores a agentes nocivos à saúde, acima dos limites toleráveis, em razão da natureza do agente, intensidade e tempo de exposição(CLT,art.189). Atividades perigosas são aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado(CLT,art.193).Quem define os tipos de atividades e operações considerados insalubres ou perigosos é o Ministério do Trabalho(CLT,art.189). A eliminação ou a neutralização do agente insalubre decorre, primeiro, da adoção de medidas que conservem o ambiente de trabalho nos limites de tolerância e, depois, da utilização dos equipamentos de proteção individual(EPI). O simples fornecimento do EPI não desobriga a empresa do pagamento do adicional. É preciso que exerça severa vigilância sobre o seu uso efetivo(Súmula 289 do TST).Uma vez comprovada a insalubridade do serviço, cabe à DRT notificar a empresa para que tome as medidas necessárias à sua eliminação ou redução(CLT, arts.191,I e II e parágrafo único). Para a apuração da periculosidade ou da insalubridade, a perícia técnica, por médico ou engenheiro de segurança do trabalho, é indispensável(CLT,art.195).Empresas e sindicatos podem pedir ao Ministério do Trabalho que realizem perícias em estabelecimentos ou setores a fim de verificar a existência de insalubridade ou de periculosidade(CLT, art.195,§1º). Se a insalubridade ou a periculosidade for alegada em juízo, o juiz designará perícia, ainda que as partes não a tenham pedido(CLT,art.195,§2º). O trabalhador rural também faz jus ao adicional de insalubridade. Assim, também, trabalhadores a céu aberto(CLT,art.195 e NR 15 MTb c/c OJ nº 173 da SDI-1 do TST) e os servidores públicos federais da administração direta, autárquica e fundacional(Decreto-lei nº 1.873/81, Decreto nº 97.458/89 e L.nº 8.270/91). Não há previsão para o trabalhador doméstico. O adicional de insalubridade é devido em 10%, 20% e 40% do salário mínimo.Se o empregado trabalha em condições insalubres e perigosas, poderá optar pelo adicional de insalubridade ou de periculosidade, mas não poderá, jamais, cumular os adicionais.O fato de a perícia apurar agente insalubre diferente do indicado na inicial não afasta o direito do empregado ao seu pagamento(Súmula nº 293 do TST).O adicional de periculosidade incide apenas sobre o salário básico do empregado, e não sobre o salário acrescido de outros adicionais(Súmula nº 191, revisada pela Res.nº 121/03, do TST).O adicional de insalubridade do empregado que recebe salário profissional, por força de lei, contrato ou convenção, incide sobre o valor desse salário, e não sobre o mínimo legal.O trabalho insalubre, embora executado em caráter intermitente, não impede o pagamento do adicional(Sumula nº 47 do TST).O frentista de posto de gasolina faz jus ao adicional de periculosidade(Súmula nº 212 do STF). Assim também o diz a Súmula nº 39 do TST quando se refere aos "operadores de bombas de gasolina".O adicional de periculosidade, pago em caráter permanente, integra o salário para todos os fins(Súmula nº 132 do TST, conversão da OJ 174 e 267 da SDI-1 do TST), mas o direito ao adicional de insalubridade ou de periculosidade cessa com a eliminação do risco(CLT, art.194).O adicional de periculosidade não incide sobre os triênios pagos pela Petrobrás(Súmula nº 70 do TST). A recusa sistemática de uso dos equipamentos de proteção individual constitui falta grave do empregado e é motivo para rescisão do contrato de trabalho, por justa causa(CLT, 158, parágrafo único, "b").

Súmula nº 364 do TST

"Periculosidade.Exposição eventual.Permanente.
I - Faz jus ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido(ex-OJ SDI-1-05;Res.TST 129/05, DJ. 20/4/2005).
II - A fixação do adicional de periculosidade, em percentual inferior ao legal e proporcional ao tempo de exposição ao risco, deve ser respeitada, desde que pactuada em acordos ou convenções coletivos(ex-OJ SDI-1-258)(Res. TST 129/05, DJ. 20/4/2005).
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1.O autor é Juiz do Trabalho no Rio de Janeiro(7ª Turma).
2.Ilustração:httpp://downloads.open4group.com/wallpapers/explosao-da-bomba-atomica-62920.jpg

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